Sempre fui uma grande admiradora do trabalho de Jodi Cobb. O empréstimo de seu olhar para a National Geográfic é sem dúvida um dos mais sensíveis e perscrutadores que particularmente já pude visualizar. Dona de inúmeros trabalhos, principalmente no campo étnico, Jodi explora espaços visuais que num primeiro momento parecem cenas comuns daquele cotidiano, mas que revelam uma intimidade longe de conseguirmos participar sem um prévio conhecimento. Suas buscas pelo oriente renderam-lhe pequenas invasões a espaços culturais fechados como os das mulheres árabes ou das Gueixas.
Hoje trazendo 3 fotos, gostaria de tentar analisar uma colocação de Philippe Dubois em seu livro O Ato fotográfico, quando ele levanta uma das grandes lebres do estudo da imagem: A Arte é ou tornou-se fotográfica? Em Jodi Cobb talvez possamos encontrar uma resposta , pelo menos creio, seja interessante porque nos três momentos fotográficos que apresento aqui, temos um objeto de arte de fato na imagem fotografada, porque trata-se da arte que impregna o próprio ser humano.
Essa primeira foto poderia ser um retrato normal do cotidiano se não fosse o tremendo contraste poético que a cerca. A mulher coberta pelo véu, revela uma sensualidade enigmática expressa pelos olhos que pouco aparecem e pela curva sinuosa de seu quadril. Em contraste com sua vestimenta de um negro profundo, temos um dia ensolarado onde duas meninas vivem uma liberdade colorida expressa em suas roupas e na sua brincadeira de balanço. A mulher parece recortada de uma outra realidade e pregada ali contra aquele fundo amarelo da areia. Ela percebe a presença da câmera, mas não se rende a ela. Ao contrário encara-a. A composição bem distribuída preenche todo o enquadramento . Mesmo que a figura da mulher tente nossos olhos para fixar sua imagem, o movimento da segunda menina reequilibra o quadro. Uma obra de arte equilibrada, se assim podemos dizer.
A foto de uma mulher etíope, volta a trazer o grande contraste de cores, que é uma das marcas de Jodi. O negro profundo da pele e do véu destacam com grande força os adereços coloridos. A foto em plano médio deixa um ar direcional a sua esquerda que não interfere na composição, pelo contrário só vem equilibrá-la já que quase toda a informação visual se encontra no lado oposto. Mesmo que o cenho da jovem mulher esteja pesado, a alegria contrastante de seus adereços nos leva a pensar a razão pela qual decidiu então usa-los. Ela encara a câmera de uma forma sutil mas firme e seu
olhar é tão penetrante que quase nos esquecemos da criança que está no seu colo escondida sob o véu em segundo plano.
Aqui temos uma jovem gueixa em seu ritual de pintura e preparação. Um momento artístico de concentração e técnica, flagrado pela lente de Jodi. A boca vermelha e arredondada como um coração ou uma maçã, torna-se convidativa e sedutora, deixando de lado o restante do conjunto. A mão contrasta com o rosto que lembra a porcelana e mostra a realidade por trás dos sonhos vendidos por essas mestras do entretenimento, não há uma real perfeição no mundo real. O vermelho vivo da boca destaca-se por conta de um fundo esverdeado. O close revela também as imperfeições do rosto que tenta vender uma pretensa perfeição. O traço é preciso e uniforme como deve ser a arte japonesa das Gueixas. Um mundo secreto que pode ter o luxo de ser analisado somente com o auxílio das lentes fotográficas que o cercam por sua sutileza e mistério.
Diante dessas imagens, voltamos a questão de Dubois. Se não existisse o ato fotográfico e esses momentos fosse apenas eternizados nas mentes de uns poucos privilegiados, o mundo talvez não pudesse compartilhar um momento da mais pura arte, em toda a sua trama perecível e efêmera. No entanto o ato fotográfico a resgata, e resgata dentro de uma particularidade que é o olhar do artista que fotografa, que talvez não fosse nem de perto o real desejo da obra, mas é o que nos deixa de herança visual. O momento do click é o “start” decisório que captura e regulariza presente, passado e futuro dos observadores que somos nós apreciadores da arte. A Beleza artística em Jodi Cobb portanto nasce arte pelo seu olhar perscrutador e torna-se fotográfica na concretização desse olhar através da captura do momento da imagem.
Minéia Gomes
Radialista/Jornalista/Fotografa
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